quinta-feira, janeiro 31, 2008

Criado espermatozóide a partir de célula feminina

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Cientistas criam espermatozóide a partir de célula feminina Cientistas britânicos afirmam ter criado espermatozóides a partir de células-tronco da medula óssea feminina - abrindo caminho para o fim da necessidade do pai na reprodução.
A experiência vem sendo desenvolvida por especialistas da Universidade de New Castle que, em abril do ano passado, anunciaram ter conseguido transformar células-tronco da medula óssea de homens adultos em espermatozóides imaturos.
Em entrevista à última edição da revista New Scientist, Karim Nayernia, um dos pesquisadores envolvidos no estudo, disse que agora os cientistas repetiram a experiência com células-tronco da medula óssea de mulheres, podendo "abrir caminho para a criação do espermatozóide feminino".
No trabalho, ainda não publicado, Nayernia disse à New Scientist estar esperando a "permissão ética" da universidade para dar continuidade ao trabalho, que consistiria em submeter os espermatozóides primitivos à meiose, um processo que permitiria a maturação do espermatozóide, tornando-o apto para a fertilização.
"Em princípio, eu acredito que isso seja cientificamente possível", disse Nayernia. O estudo, afirma a revista, poderia possibilitar que um dia, casais de lésbicas poderão ter filhos sem a necessidade de um homem, já que o espermatozóide de uma mulher poderia fertilizar o óvulo da outra.

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Mas báááááá

terça-feira, janeiro 08, 2008

Como assim “bissexual”?*

Reflexões de uma mulher orgulhosamente bissexual
Por Clarissa Carvalho

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“Aquela ali não dá porque é lésbica. Não! Ela também fica com homens! Ah, então tudo bem, ainda há chance de salvação. Bom pra mim.”
“Não, peraí, isso não existe: ou você gosta de alguém do sexo oposto, ou de alguém do mesmo sexo. Decida-se.”

Essas são algumas reflexões (?) correntes sobre a bissexualidade. Eu diria que existe uma idéia pré-concebida comumente aceita de que “é mais fácil ser bi”, “bis são mais
aceit@s porque essas pessoas podem desfrutar os espaços e os direitos ‘normais’, e ainda se decidirem, um dia à noite numa festa podem fazer ‘algo diferente’”. Não transgrediram completamente, então, se continuarem, pelo menos publicamente exercendo a heterossexualidade, é permitido e até exótico/excitante uma homossexualidade mais velada e, de preferência, eventual.
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É mais fácil ser bi?
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Qualquer idéia ligada a uma “aceitação da bissexualidade” é equívoca porque ela, de maneira alguma, compreende o que é ser bi. Ou seja, quem diz que ser bi é mais aceito é porque não entende o que é ser bi. A questão aqui não é se eu não sou discriminada quando estou com um homem, a questão é entender como que o meu desejo funciona. E te digo, meu desejo não é heterossexual de dia no restaurante com a família e homossexual à noite na boate “gls
[1]”.
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O preconceito de fora
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No imaginário social comum, em geral, a aparente aceitação da bissexualidade é uma velada desconsideração da mesma. Aceita a bissexualidade o homem heterossexual que se diverte com meninas que transam na sua frente, quando o objetivo final é excitá-lo. Para ele, essa bissexualidade pode: que é apenas uma fantasia direcionada à ele, que só envolve atração física e nunca a afetiva e que todo desejo partilhado entre as mulheres não seja superior ao desejo que ambas sentem pelo seu pênis. Aí pode: “adoramos mulheres bissexuais!!!!” . “Eu só tenho ciúmes de minha namorada com homens.”
Aceita-se a bissexualidade talvez na adolescência, quando ela/ele está apenas experimentando, “coisa de criança”, “ta na moda!” “daqui a pouco essa fase passa, quando ela conhecer alguém de verdade”. Tem-se a idéia, sempre, de que se há o desejo heterossexual entre as/os que se dizem bissexuais, ele sempre é mais forte e que a homossexualidade é provisória, fruto de alguma perturbação momentânea.
Pode-se transar com uma amiga para excitar o namorado, mas não se pode apaixonar-se por ela. E aí, eu pergunto onde está a tal da “aceitação”? O mais interessante é que a noção de gênero está muito presente nessa forjada e hipócrita “aceitação”. Pois nas fantasias heterossexuais raramente há aceitação de homens bissexuais. A namorada raramente tem a fantasia de ver o namorado com outro homem, já homens E mulheres heterossexuais têm, comumente, fantasias com mulheres transando. A indústria pornográfica de massa incentiva relações sexuais entre mulheres, desde que orientadas pelo desejo heterossexual. Muito difícil é ver relações sexuais entre homens em filmes direcionados a pessoas heterossexuais. Se homem transou com homem, acabou: é gay. Se mulher transou com mulher: obviamente ela só está excitando o expectador/a. Homens bis são gays promíscuos e mulheres bis são fantasias. Essa idéia está muito mais perto de uma mercantilização do corpo feminino e banalização do desejo lésbico em prol das meras fantasias heterossexuais, do que de uma “aceitação da bissexualidade”.
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O preconceito de dentro
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Por outro lado, a aceitação que o movimento LGBTTT tem para com bis é ótima, se eu mulher, estou defendendo os direitos de ser lésbica. Parece que se estou numa relação heterossexual de longa duração, não há sentido de eu estar militando como LGBTTT, mesmo sendo militante bissexual. Mas como é você fazer parte de um grupo de lésbicas e bissexuais e de repente começar a namorar sério um cara (que inclusive está disposto a ir às paradas LGBTTT’s com você)? Como você vai trazer para o grupo de lésbicas os problemas que você está tendo com o seu parceiro? Existe espaço para isso? O “b” está na sigla, mas o que ele diz nas paradas? Você tem espaço para trazer seu parceiro para uma parada e não levar, no mínimo, olhares atravessados, entre, claro, as mais diversas piadinhas?
Eu sinto, muitas vezes, no próprio movimento, um ar de rejeição. “O que está fazendo com esse cara? Você não militava com a gente? Ah, não era lésbica de verdade, estava apenas brincando.” Parece não existir a orientação bi. Ou você joga de um lado, ou joga de outro. Há a idéia da “lésbica enrustida”, aquela que no fundo é lésbica, sente desejos apenas por mulheres, mas de vez em quando fica com homens por covardia de assumir-se como lésbica. Parece que é um projeto incompleto, um trabalho inacabado, alguém que não teve coragem de subverter totalmente e mantém práticas heterossexuais como estratégias de defesa, proteção e desfrute de privilégios.
Em poucas palavras, ser bi é fácil quando você é hetero para a “normalidade” e quando você é lésbica para a “anormalidade”. E para muitas pessoas, eu entendo que ser bi é “se aproveitar” das situações e dos espaços que estão postos de forma dicotômica e necessariamente antagônica. É a velha história do “joga para os dois lados”, traiçoeira/o, interesseira/o, desleal, sem comprometimento, covarde, sem identidade.
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Mas o que é ser bi, afinal?
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O desejo não procura um gênero específico. O que não quer dizer que bis não tenham gosto ou sejam promíscuas/os: “pegam todo mundo”. Aliás, aqui entre nós: dispenso essa noção de promiscuidade, uma vez que ela não acrescenta nenhum valor legítimo, além de barrar as liberdades das pessoas para com os seus corpos e ações. Ser bi não e ser homossexual enrustida/o. Eu não estou com um cara agora, para não sofrer discriminação. Eu estou com ele porque ele me atraiu, porque nós conversamos e nos demos bem, assim como amanhã isso pode acontecer com uma garota. Assim como ser bi não é ser uma pessoa heterossexual que lá de vez em quando, numa festa mais “alternativa”, quando estou bêbada/o, eu fico com pessoas do mesmo sexo. Ou ainda, fica com pessoas do mesmo sexo, mas não sente tesão o bastante para transar ou sentimento o bastante para amar.
Não quer dizer também, que bis têm dias e ocasiões certas para gostar de cada sexo. O desejo é imprevisível, muitas vezes, está mais no seu objeto de atração (te surpreendendo) do que em você, como uma idéia preconcebida. Pessoas bis podem ter longas fases heterossexuais e anos depois começar um relacionamento sério homossexual. Nada impede que eu ame apenas mulheres durante dez anos de minha vida e depois ame um homem durante dois anos, por exemplo. Assim como há bissexuais que têm preferências homossexuais, ou heterossexuais. Por exemplo: há mulheres bissexuais que preferem ficar com mulheres, vivendo quase toda suas vidas orientada à lesbiandade, mas que eventualmente apaixonam-se por homens sem ter grandes crises de identidade, ou problemas com desejo sexual, porque sua identidade é bi.
Assim como na homossexualidade, na bissexualidade não existe relação entre o gênero da pessoa e de sua aparência com o seu desejo sexual. É mito quando se pensa que as mulheres “mais femininas” são bis porque ficam com homens. Não. Há mulheres de aparência mais masculinas que gostam de ficar com homens, sejam elas bissexuais, ou heterossexuais. Assim, como há homens com traços femininos que podem se sentir atraídos por mulheres. Travestis, transexuais e transgêneros podem ser bissexuais, pois sua identidade de gênero, independe do seu desejo afetivo e sexual.
Não há sentido de haver uma identidade de bissexual – uma letrinha “b” no LGBTTT – se não se compreende uma pessoa bissexual como bissexual e sim como uma pessoa homossexual enrustida, ou heterossexual promíscua. Existe uma especificidade em ser bi que deve ter o seu lugar, a sua voz e suas demandas. É claro, porém, que mulheres bissexuais militantes possuem praticamente as mesmas demandas de mulheres lésbicas no movimento LGBTTT, porém, falta um espaço, muitas vezes para que problemas “bis” sejam abordados, e que as próprias pessoas bissexuais visíveis como realmente são.
Posso amar mulheres agora, homens amanhã, depois mulheres novamente e isso não me faz lésbica ou heterossexual essencialmente ou naquele momento. Eu sou bissexual sempre e sinto orgulho.



[1] A expressão “GLS” foi usada intencionalmente. Ela reflete exatamente a hipocrisia de uma “aceitação LGBTTT”, uma vez que não possui uma proposta política, mas sim o intuito de tornar a homossexualidade algo menos chocante, mais exótico e que gere lucros.
* Texto orinalmente escrito para o zine da LBL/DF. Ainda em construção.